A energia produzida pelas centenas de usinas do país deve igualar a cada minuto o consumo de eletricidade. No passado, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) alcançava este equilíbrio ajustando continuamente a energia produzida por hidrelétricas e termelétricas.
No entanto, a entrada de usinas eólicas e solares tornou este processo de ajuste mais complexo, pois estas usinas não são controláveis: sua geração depende da intensidade do vento e sol, que varia rapidamente a cada instante. Por esta razão, os operadores em todo o mundo passaram a utilizar recursos de armazenamento, como baterias. De uma maneira muito simplificada, as baterias armazenam a energia renovável quando ela é excessiva e vice-versa: injetam a energia armazenada previamente quando há uma queda na produção renovável.
No caso do sistema brasileiro, este uso de baterias existe há muitas décadas; só que usávamos “baterias de água”, que eram os reservatórios das usinas hidrelétricas; e as fontes renováveis não controláveis eram as chuvas, que se transformavam em vazões nos rios. Quando as primeiras usinas eólicas foram instaladas no Brasil, o ONS usou os reservatórios exatamente como uma bateria, diminuindo a geração hidrelétrica (e, portanto, mantendo os reservatórios mais cheios) quando ventava muito, e vice-versa: esvaziando um pouco mais os reservatórios para aumentar a produção hidrelétrica quando o vento diminuía. Por esta razão, os especialistas do setor criaram a imagem de que os reservatórios passaram a ser “armazéns de energia”, estocando o excesso de energia produzido pelas eólicas. Embora a expressão “estocar vento” seja hoje um “meme” associado à então ministra de Minas e Energia Dilma Roussef, ela é tecnicamente correta.
Outro fato interessante é que a capacidade de armazenamento das “baterias de água” é gigantesca comparada com as baterias de lítio. Por exemplo, custaria cerca de US$ 4 trilhões em baterias de lítio para se ter a mesma capacidade de armazenamento de energia de uma única hidrelétrica, a usina de Furnas. Por outro lado, as baterias de lítio podem ser instaladas em qualquer lugar, enquanto as hidrelétricas estão restritas aos locais onde as condições topográficas e de chuva são favoráveis.
Existe ainda um terceiro tipo de armazenamento, intermediário entre as hidrelétricas e as baterias, que são as usinas reversíveis. De maneira simplificada: estas usinas bombeiam água de um reservatório no nível do solo para outro reservatório superior quando há excesso e geram energia revertendo esse fluxo quando há escassez.
Em resumo, o Brasil dispõe de um “portfolio” de recursos de armazenamento em que há um “tradeoff” entre capacidade de armazenamento e flexibilidade de localização. Otimizar este portfolio tanto no planejamento de novos recursos como no seu uso pelo operador é um problema complexo em termos matemáticos. Felizmente, a experiência que o país tinha com a gestão dos reservatórios das hidrelétricas contribuiu para o desenvolvimento de metodologias de gestão de armazenamento, colocando o Brasil em posição de liderança neste tema. Por exemplo, a PSR licencia modelos computacionais que usam estas metodologias avançadas para dezenas de países em todos os continentes, incluindo sistemas como o da Costa Noroeste dos EUA e o Nord Pool europeu, um dos maiores mercados de energia do mundo.