As recentes eleições no Leste Europeu amentaram os debates sobre a influência da Rússia na região, onde crescem os temores de interferência política. Romênia, Geórgia e Moldávia convivem com manifestações políticas e a discussão entre políticos pró-Ocidente e pró-Rússia protagonizaram as campanhas deste ano. A guerra entre a Rússia e a Ucrânia, que já dura quase 3 anos, intensifica as disputas políticas.
Nesse contexto, os pleitos políticos tornaram-se palco de uma disputa geopolítica que tem potencial de alterar o equilíbrio de poder na Europa Oriental e impactar o rumo da guerra entre a Rússia e a Ucrânia.
De um lado, políticos mostram à luz da invasão russa na Ucrânia a necessidade de se desvincularem da Rússia a fim protegerem suas soberanias nacionais. Para isso, os países do Leste Europeu, muitos marcados pela herança soviética, buscam se aproximar do Ocidente para conseguir integração econômica e ajuda militar para se defenderem de possíveis ataques de Moscou.
Em oposição a isso, outros grupos políticos da região citam o impacto financeiro causado aos países que financiam Kiev no conflito e destacam a proximidade cultural e política já existente entre os seus países com Moscou.
INFLUÊNCIA NAS ELEIÇÕES NO LESTE EUROPEU
A vitória de candidatos alinhados com o presidente russo, Vladimir Putin, no Leste Europeu pode enfraquecer o apoio a Kiev, diminuir as sanções econômicas contra Moscou, criar divisões internas na União Europeia e até propiciar espaços militares para a Rússia fora do país, como Belarus já proporciona.
Em contrapartida, a vitória de mais candidatos pró-Ocidente no Leste Europeu pode aumentar o isolamento político e econômico de Moscou, bem como ampliar a pressão internacional para o fim do conflito travado na Ucrânia.
Em 2025, ao menos 5 países da Europa Oriental (Albânia, Belarus, República Tcheca, Moldávia e Polônia) terão eleições. Desses, somente Belarus é hoje alinhado com os interesses de Moscou.
EX-REPÚBLICAS SOVIÉTICAS & RÚSSIA
A política externa dos países do Leste Europeu são complexas e contém singularidades em cada contexto. Os países bálticos (Estônia, Lituânia e Letônia), por exemplo, depois de conquistarem a independência da União Soviética, se voltaram à Europa e deixaram de depender de Moscou para manterem suas economias e instituições. Esses países se posicionarem contra a invasão russa à Ucrânia e apoiam Kiev no conflito.
A Armênia, no entanto, não se desvinculou de Moscou como os países do mar Báltico. A proximidade dos armênios com o governo russo se fez importante durante décadas por causa do pacto militar que assegurava a proteção de armênios de Nagorno-Karabakh –região separatista do Azerbaijão de maioria etnicamente armênia que afirma ser vítima de uma “limpeza étnica”.
Contudo, a histórica relação de proximidade se esfriou depois de o início do conflito na Ucrânia. Os russos reduziram seu apoio à Armênia, que acusa o país de Vladimir Putin de não cumprir os acordos militares firmados no passado. Isso levou o premiê da Armênia, Nikol Pashinyan, a se aproximar do Ocidente em busca da proteção. Apesar disso, tenta manter uma posição de neutralidade no conflito par não perder o apoio bélico russo.
A Geórgia, com destaque para a região separatista da Abecásia, permaneceu com laços estreitos com o Kremlin. Isso dificulta a independência política do país e o torna cenário de constantes manifestações contra a influência russa em território georgiano.
ACUSAÇÕES DE FRAUDES NAS URNAS
A Romênia é o caso mais recente de instabilidade política pós-eleições. Depois de denúncias de interferência russa e ataques cibernéticos, a Justiça do país determinou a recontagem dos votos do 1º turno da disputa presidencial.
O resultado oficial deu a liderança ao candidato pró-Rússia Calin Georgescu (independente, direita), que tinha só 5% das intenções de voto nas pesquisas. Passou ao 2º turno com 22%. A 2ª rodada da eleição está marcada para 8 de dezembro e poderá intensificar os protestos no país.
Antes da Romênia, a Geórgia foi palco de protestos. No país, o partido pró-Rússia Sonho Georgiano venceu a eleição legislativa deste ano, derrotando a oposição, que tinha como principal bandeira de campanha o ingresso à União Europeia. O processo foi suspenso.
O resultado aprofundou a insatisfação de milhões de georgianos, que desde maio protestavam contra a “lei russa” aprovada no país. A vigência do texto fez com que a UE barrasse o processo de adesão do país do Mar Negro ao bloco, que afirma que a lei é usada na Rússia para censurar opositores.
A vitória do Sonho Georgiano foi amplamente contestada pelo lado derrotado, que acusa o partido de manipulação, fraude, suborno e suporte russo. Manifestantes ainda protestam contra o resultado e a coalizão de oposição não reconhece o resultado da eleição.
Assista a um dos protestos recentes (27seg):
🇬🇪#GeorgiaProtests NOW. Waves of people are gathering in the streets of Tbilisi to prevent Georgian Dream’s illegitimate Parliament from convening tomorrow. More people are expected to join the protest in the morning. pic.twitter.com/v1Hcr5W72Q
— Anna Gvarishvili (@AnnaGvarishvili) November 24, 2024
A Moldávia é outro país do Leste Europeu que vive sob a sombra de Moscou. A eleição de Maia Sandu (Partido da Ação e Solidariedade, pró-Ocidente) a presidente, em 3 de novembro, foi marcada por mais acusações de intromissão do governo Putin.
Os russos foram acusados por autoridades moldavas de pressionar cidadãos para votar em candidatos alinhados com Putin. A Rússia nega qualquer envolvimento na campanha e no resultado eleitoral, que teve uma política pró-Ocidente eleita.
A Moldávia também tem uma região separatista e independente reconhecida pela Rússia, a Transnístria.
FUNDAMENTAÇÃO DAS ACUSAÇÕES
Vladimir Putin é acusado por opositores de aplicar métodos de conquista de poder creditadas ao vice-ministro da Defesa russo, o general Valery Gerasimov.
Em um artigo publicado em 2013, Gerasimov fez uma análise sobre guerra no século 21 e constatou a necessidade de empregar métodos de combate militar e não militar para que o país tenha sucesso em suas estratégias geopolíticas.
Segundo a teoria, que leva o seu nome (doutrina Gerasimov), os métodos não militares incluem desinformação, guerra cibernética e psicológica. A mescla dessa estratégia com o meio convencional de conflito é chamada de “guerra híbrida”.
Apesar das acusações, a Rússia não empreende oficialmente os métodos descritos na doutrina Gerasimov. Moscou nega as acusações feitas e afirma que sua estratégia de inserção na arena internacional se dá com o objetivo de fortalecer a soberania e a segurança e tornar o mundo multipolar.
Este post foi produzido pelo estagiário de jornalismo José Luis Costa sob a supervisão do editor-assistente Ighor Nóbrega.